O Estatuto da Pequena Agricultura Familiar
O Estatuto da Pequena Agricultura Familiar (EPAF) esteve em consulta pública até ao dia 31 de janeiro de 2018. Trata-se de um projeto de Decreto-lei que visa criar uma espécie de “Lei de Bases da Pequena Agricultura Familiar” produzido por uma Comissão Interministerial para a Pequena Agricultura Familiar, criada através do Despacho n.º 7423/2017, de 4 de agosto, visando responder aos principais desafios e reforçar as potencialidades desta importante modalidade de organização de atividades produtivas, de gestão do ambiente e de suporte da vida social nos espaços rurais do nosso país.
Desde a década de 60 que a pequena e muito pequena agricultura é vítima de políticas agrícolas dirigidas quase exclusivamente às explorações entendidas como competitivas. O abandono desses territórios e os incêndios rurais cada vez mais graves são resultado, em grande medida, dessa política.
Lamentavelmente, a proposta do Governo para o EPAF, agora em apreciação, vai no mesmo sentido e não responde aos problemas existentes.
Em primeiro lugar, em resultado dos critérios e inúmeras condicionantes de acesso avançados pelo Governo, o Estatuto da Agricultura Familiar irá abranger um reduzidíssimo número de explorações, falseando a ideia de que se destina à Pequena Agricultura Familiar que, na maior parte dos casos, já não é a principal fonte de rendimento dessas famílias. Concretamente, com a aplicação dos critérios do Governo, mais de 86% dos pequenos e muito pequenos produtores ficariam fora do EPAF e dos respetivos benefícios.
Aliás, a exigência de que todas as explorações se situem “em prédio rústico ou misto inscrito no registo, na matriz e no cadastro prediais” exclui deste Estatuto praticamente todas as explorações localizadas a norte do rio Tejo.
Depois, o projeto de EPAF remete para regulamentação discricionária um conjunto de “direitos” que no texto são apresentados de forma lata, sem quantificação nem metas temporais. Sobre cada um dos direitos enunciados não há nenhuma garantia da sua concretização.
O Bloco de Esquerda considera que o Estatuto da Pequena Agricultura Familiar deve ser desenhado de forma a incluir todas as explorações agrícolas que apresentem uma Dimensão Económica abaixo de 25 mil euros de Valor de Produção Padrão Total, independentemente da origem dos rendimentos, do valor da declaração do IRS dos respetivos titulares e da residência principal do responsável pela exploração.
O Bloco de Esquerda reconhece a importância do Cadastro da propriedade rústica, mas a sua execução não pode ser imposta à custa de exclusões e maiores penalizações sobre quem tem sido sistematicamente penalizado e excluído.
Todos os direitos previstos no EPAF devem ser regulamentados no prazo de seis meses a contar da data de entrada em vigor do respetivo Decreto-lei de forma a garantir que todos os objetivos nele enunciados serão, efetivamente, assegurados.
O Bloco de Esquerda rejeita o projeto de Estatuto de Agricultura Familiar na sua atual forma, excludente da esmagadora maioria daqueles que supostamente visa apoiar, e contribuirá para uma necessária e profunda reformulação, usando para esse efeito todos os mecanismos disponíveis.