Pelo fim da violência de género e por medidas efetivas de combate ao crime de violação

A violência de género continua a ter um impacto devastador na sociedade portuguesa. Nas suas várias expressões, assenta num modelo de organização da sociedade que teima em menorizar o papel das mulheres em várias dimensões da vida: trabalho, escola, política, família. 

Reconhecemos os muitos avanços que têm sido conseguidos e que têm permitido, aos poucos, trazer mais justiça e igualdade, mas ainda há muito trabalho por fazer, nomeadamente na forma como se tratam crimes sexuais como a violação. Recordamos que o debate sobre a violência doméstica foi longo e precisou de muitas vozes para alcançar avanços legais substantivos, e num momento em que tantos casos repugnantes de violência sexual têm vindo a público é necessário retomar esta discussão. 

O Bloco de Esquerda fez aprovar por unanimidade esta moção em reunião de câmara. O seu texto completo:

Os crimes sexuais atingem, sobretudo, mulheres e crianças. Apesar da neutralidade prevista no tipo legal de violação quanto ao género da vítima, estes crimes carregam a marca de género e continuam a ser uma das formas de violência de género mais invisíveis. Não é por acaso que, de acordo com os dados dos Relatórios Anuais de Segurança Interna (RASI), nenhuma mulher foi detida por violação. Todos os arguidos são homens. A esmagadora maioria das vítimas é mulher.

A violação manifesta-se como uma das mais abjetas e extremas formas de opressão e dominação das mulheres e configura um atentado aos direitos humanos das mulheres, à sua integridade física e emocional, à sua liberdade e autodeterminação sexual. Deixa, na maior parte das vezes, feridas profundas para o resto da vida. No entanto, e apesar do seu impacto na sociedade, a média europeia de condenações do crime de violação é de apenas 14%.

O Relatório Anual de Segurança Interna regista 431 queixas por violação em 2019. Uma subida de 2,4% face ao ano anterior. É o terceiro ano consecutivo de subida dos casos registados de violação.  Os arguidos em casos de violação são quase todos homens (99,3%) e as vítimas são principalmente as mulheres (91,9%). Frequentemente os agressores são pessoas conhecidas (35,9%) ou familiares (22,1%).

Num juízo análogo ao que se levou a cabo para a violência doméstica, é importante reforçar a ideia de que a violação e a coação sexual são assuntos que não podem ficar por investigar e que se trata de uma responsabilidade de toda a comunidade. À semelhança do crime de violência doméstica, este não pode ser considerado um crime do foro privado. Onde existir uma mulher agredida, abusada, violada, existe um atentado aos Direitos Humanos. É, pois, necessário criar o dever, que toda a sociedade deve respeitar, de denunciar qualquer caso de violação de que tenha conhecimento. Importa, como se vê, mudar a natureza dos crimes de violação e de coação sexual, tornando-os crimes públicos.

As notícias que com alguma frequência nos dão conta de casos de violação ou tentativa de violação não podem deixar ninguém indiferente e alertam-nos para a necessidade de alterações profundas. 

Neste sentido e do ponto de vista municipal, e considerando o trabalho feito no caminho de construção de programas que pretendem aumentar a consciência para estes problemas e a procura de soluções, consideramos que deve ser tomada uma posição clara de repúdio contra a violência de género e, em particular, contra os crimes sexuais. Mas, mais do que isso, é importante tomar ação. 

Assim, a Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, reunida em 03 de março de 2021, delibera, ao abrigo do artigo 25.º, n.º2, alíneas j) e k) do Anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro:

  1. Condenar todos os crimes sexuais.
  2. Instar a Assembleia da República a tomar as medidas necessárias com vista a consagrar o caráter de crime público aos crimes de violação e coação sexual.
  3. Remeter esta moção à Assembleia da República (Comissão Parlamentar de Direitos, Liberdades e Garantias), à CIG – Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, à CITE – Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, e às associações e movimentos envolvidos nas iniciativas comemorativas do 8 março; Assembleia Municipal; Uniões de Freguesia e Freguesias do Concelho e Comunicação Social.

 

Os vereadores eleitos do Bloco de Esquerda

Luís Gomes